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sábado, 14 de março de 2009

A Essência do Ensinamento do Buda - Thich Nhat Hahn


Os Cinco sentidos (agregados) são interdependentes. Quando nos ocorre uma sensação dolorosa, devemos olhar para o corpo, para as nossas percepções, nossas formações mentais e nossa consciência, procurando a causa dessa sensação. Se tivermos uma dor de cabeça, a sensação dolorosa vem do Primeiro Agregado. Sensações dolorosas também podem se originar das formações mentais ou das percepções. Você pode, por exemplo, pensar que alguém o detesta, quando na verdade essa pessoa o ama.Observe com atenção os cinco rios que correm dentro de você e veja como cada um deles contém em si os outros quatro. Olhe para o rio do corpo. No início você pode achar que o corpo é apenas físico e não mental. Só que cada célula de seu corpo contém dentro dela todas as informações contidas no seu corpo inteiro. Hoje em dia já é possível duplicar o corpo inteiro a partir de uma única célula, o que chamamos de clonagem. A unidade contém o todo. Uma única célula do seu corpo contém seu corpo inteiro. Isso significa que todas as sensações, percepções, formações mentais e consciência estão contidas em uma única célula - não apenas os nossos, mas também os de nossos pais e de nossos ancestrais. Cada agregado contém todos os outros agregados. Cada sensação contém em si todas as percepções, formações mentais e consciência. Ao observar uma sensação, podemos descobrir nela os outros elementos. Observe à luz da interdependência, e verá o todo na unidade e a unidade no todo. Não pense nem por um instante que o corpo existe fora das sensações ou que as sensações existem fora do corpo.No Sutra Girando a Roda, o Buda diz: “Quando nos apegamos aos Cinco Agregados, eles produzem sofrimento”. Ele não disse que os agregados são, por si mesmos, o sofrimento. Há uma imagem no Sutra Ratnakuta que nos pode ser útil. Um homem joga um bolo de terra para um cachorro. O cachorro olha para o bolo de terra e late furiosamente, porque não entende que é o homem, e não o bolo de terra, o responsável por sua frustração. O sutra continua: “Da mesma maneira, uma pessoa comum, presa a conceitos dualistas, pensa que os Cinco Agregados são a causa de seu sofrimento, enquanto na verdade a raiz do sofrimento está na falta de compreensão da natureza impermanente, sem existência separada, e interdependente dos Cinco Agregados”. Não são os Cinco Agregados que nos fazem sofrer, mas a forma como nos relacionamos com eles. Ao observarmos a natureza impermanente, interdependente e sem existência própria de tudo o que existe, não sentimos aversão pela vida, mas, ao contrário, constatamos como a vida é preciosa.Sempre que não entendemos muito bem, apegamo-nos demais, ficando presos às coisas. No Ratnakuta Sutra, os termos “agregado” (skandha) e “agregado do apego” (upadana skandha) são usados. Os skandhas são os Cinco Agregados que dão origem à vida. A raiz de nosso sofrimento não está nos agregados em si, mas em nosso apego. Existem pessoas que, devido à compreensão incorreta da razão do sofrimento, em vez de lidarem com seus apegos, têm medo dos seis objetos dos sentidos e aversão pelos Cinco Agregados. Um Buda é alguém que vive em paz, alegria e liberdade, alguém que não tem medo nem está apegado a nada.Quando inspiramos e expiramos e harmonizamos os Cinco Agregados dentro de nós, realizamos a verdadeira prática. Mas praticar não significa nos limitarmos aos Cinco Agregados internos. Temos consciência de que os Cinco Agregados também têm raízes na sociedade, na natureza e nas pessoas com quem vivemos. Medite no conjunto dos Cinco Agregados dentro de você, até poder ver a unidade que existe entre você e o universo. Quando o Bodhisattva Avalokita contemplou a realidade dos Cinco Agregados, viu o vazio do “eu”, e se libertou do sofrimento. Se contemplarmos os Cinco Agregados com consistência, nós também nos libertaremos do sofrimento. Se os Cinco Agregados retornarem à sua origem, o sentido de “eu” deixa de existir. Enxergar a unidade dentro do todo significa romper com o apego a uma falsa idéia de “eu”, a convicção de que o “eu” é uma entidade imutável com existência própria. Romper essa falsa visão significa se libertar de todos os tipos de sofrimento.