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domingo, 19 de abril de 2009

A Mente Natural - Chandrakirti

Chandrakirty

Falamos de “verdadeira natureza” porque ninguém a criou.

Chandrakirti, Entering the Middle Way, traduzido para o inglês por Ari Goldfield.

Uma das primeiras coisas que aprendi como budista foi que a natureza fundamental da mente é tão ampla que transcende completamente a compreensão intelectual. Ela não pode ser descrita em palavras ou reduzida a conceitos. Para alguém como eu, que gosta de palavras e sente-se muito confortável com explicações conceituais, isso era um problema.
Em sânscrito, a língua na qual os ensinamentos de Buda foram originalmente registrados, a natureza fundamental da mente é chamada de tathagatagarbha, uma descrição muito sutil e aberta a diferentes interpretações. Literalmente significa “a natureza daqueles que foram naquela direção” são as pessoas que realizaram a completa iluminação – em outras palavras, as pessoas cujas mentes suplantaram completamente as limitações comuns que podem ser descritas em palavras.
Acho que você concordaria comigo no sentido que essa definição não ajuda muito.
Outras traduções menos literais utilizam termos como “natureza búdica”, “verdadeira natureza”, “essência iluminada”, “mente comum” e até “mente natural” para descrever o tathagatagarbha, mas nenhum deles lança muita luz sobre o verdadeiro significado da palavra. Para efetivamente entender o tathagatagarbha, você precisa vivenciá-lo diretamente, o que, para a maioria de nós, ocorre, em primeiro lugar, na forma de vislumbres rápidos e espontâneos. Quando, finalmente, vivenciei meu primeiro vislumbre, percebi que tudo o que os textos budistas falam a respeito é verdade.
Para a maioria de nós, nossa mente ou natureza búdica é obscurecida pela auto-imagem limitada criada por padrões neuronais habituais – que, por si, são o reflexo da capacidade ilimitada da mente de criar qualquer condição que ela escolha, uma pepita de ouro coberta de lama e sujeira. A mente natural é capaz de produzir qualquer coisa, até mesmo a ignorância de sua própria natureza. Em outras palavras, não reconhecer a mente natural é um exemplo da capacidade ilimitada da mente de criar o que ela quiser. Sempre que sentimos medo, tristeza, inveja, desejo ou qualquer outra emoção que contribua para o nosso senso de vulnerabilidade ou fraqueza, deveríamos dar um bom tapinha em nossas costas. Acabamos de vivenciar a natureza ilimitada da mente.
Apesar da verdadeira natureza da mente não poder ser descrita diretamente, isso não significa que não deveríamos ao menos tentar desenvolver algum conhecimento teórico sobre ela. Mesmo um entendimento limitado é pelo menos uma placa apontando para o caminho na direção da experiência direta. O Buda entendia que as experiências impossíveis de serem descritas em palavras poderiam ser mais bem explicadas por meio de histórias e metáforas. Em um texto, ele comparava o tathagatagarbha, a uma pepita de ouro coberta por lama e sujeira.
Imagine que você esteja em uma caça ao tesouro. Um dia, você vê um pedaço de metal no chão. Você cava um grande buraco, retira o metal, leva-o para casa e começa a limpa-lo. No começo, uma parte da pepita se revela, brilhante e cintilante. Aos poucos, a medida que você limpa a sujeira e a lama acumulada, a pepita inteira se revela como ouro. Agora, pergunto: o que é mais valioso – a pepita de ouro enterrada na lama ou a que você limpou? Na verdade, o valor é o mesmo. Qualquer diferença entre a pepita suja e a limpa é superficial.
O mesmo pode ser dito da mente natural. Na verdade, a fofoca neuronal que o impede de ver sua mente na totalidade não altera a natureza fundamental de sua mente. Pensamentos como ”Eu sou feio”, “Eu sou um idiota” ou “Eu sou um chato” não são nada mais do que uma espécie de lama biológica, temporariamente obscurecendo as brilhantes qualidades da natureza búdica ou mente natural.
Algumas vezes o Buda comparava a mente natural ao espaço, não necessariamente como o espaço é entendido pela ciência moderna, mas sim no sentido poético da experiência profunda de abertura que se sente ao olhar para um céu sem nuvens ou entrar em uma ampla sala. Como o espaço, a mente natural não depende de causas ou condições previas. Ela simplesmente é: incomensurável e além da caracterização, o pano de fundo essencial por meio do qual nos movimentamos é relativo ao qual reconhecemos distinções entre os objetos que percebemos.

Extrato do livro: A ALEGRIA DE VIVER – de Yongey Mingyur Rinpoche

Leon Bonaventure


“Na busca de sua alma e do sentido de sua vida, o homem descobriu novos caminhos que o levam para a sua interioridade: o seu próprio espaço interior torna-se um lugar novo de experiência. Os viajantes desse caminho nos revelam que somente o amor é capaz de gerar a alma, mas também o amor precisa da alma. Assim, em lugar de buscar causas, explicações psicopatológicas às nossas feridas a aos nossos sofrimentos, precisamos, em primeiro lugar, amar a nossa alma assim como ela é. Deste modo é que poderemos reconhecer que estas feridas e estes sofrimentos nasceram de uma falta de amor. Por outro lado, revelam-nos que a alma se orienta para um centro pessoal e transpessoal, para a nossa unidade e para a realização de nossa totalidade. Assim, a nossa própria vida carrega em si um sentido, o de restaurar a nossa unidade primeira”.


(Léon Bonaventure)